terça-feira, 11 de junho de 2024

O Vampiro de Versalhes - Parte V

A Condessa Russa
Paris, 13 de janeiro de 1882
Você ainda está viva? Faço essa pergunta porque faz algumas décadas que nos correspondemos, mas minhas últimas cartas não encontram resposta de sua parte. Provavelmente você já morreu... Muitas vezes esqueço como a vida humana é fugaz, como os seres humanos são frágeis. Morrem por qualquer coisa, por qualquer acidente banal. Nesses momentos até fico feliz por ter me tornado um vampiro. Claro, há dias em que isso de sair atrás de presas humanas é mortalmente chato e enfadonho, ainda mais quando o tempo vai se acabando, o sol vai nascendo e você precisa se alimentar de qualquer um que cruze seu caminho... Já cheguei até mesmo a me alimentar de um morador de rua... Eu sei, eu sei... é complicado... mas tenho que viver e o sangue é precioso, seja de quem for...

Vamos em frente, quero te contar mais uma história de Maximilian... Eu vou contar essa historia como se fosse na terceira pessoa simplesmente porque parece que nem vivenciei isso, parece um livro que li há muitos anos e que agora me recordo como se fossem minhas lembranças, mas que não são e ao mesmo tempo são.. Delírios, devaneios de uma mente vampiresca, mas chega disso, deixa eu te contar como aconteceu...

Em meados de 1820 o vampiro Maximilian ouviu falar que a condessa russa Raissa estava em Paris. Uma mulher fabulosamente rica, única herdeira de um militar que havia caído nas graças do czar. Com sua morte ela teria herdado milhões em jóias, propriedades e dinheiro, depositado nos mais exclusivos bancos da Europa. 

Apesar de toda a riqueza, a condessa era uma pessoa desprezível. Ela era uma mulher cruel. Apesar de possuir olhos verdes, todo o conjunto era tenebroso. Ao invés de ter curvas, como convém a uma bela mulher, ela tinha o corpo quadrado. Não havia seios. Era magra em demasia. Os dentes estavam amarelados pelo fumo. O conjunto era ruim. Era uma mulher feia por fora e por dentro.

Ela procurava compensar sua feiura indo atrás de belas jovens. Era lésbica. Porém ao invés de se relacionar com essas moças, que eram lindas, mas pobres, a condessa abusava de todas elas. No começo enchia todas dos mais belos vestidos. Das mais belas jóias. 

Depois quando começavam a se sentir belas, a condessa começava a tirar tudo. Era um jogo psicológico doentio. Ela queria humilhar, desprezar a juventude a a beleza dessas mulheres. Na Rússia se dizia que ela havia matado algumas de suas servas. Não por acaso as mais belas. Ela tinha complexo de inferioridade perante aquelas belas jovens. Como era feia e ruim, queria destruir a beleza feminina da face da terra.

Quando as mortes começaram a incomodar, por terem caído na boca do povo, a condessa decidiu ir embora para Paris. Só que na capital francesa ela não perdeu o gosto pela morte. Em poucas semanas já surgia como suspeita da morte de uma jovem empregada. Só que Paris não era São Petersburgo. Na capital francesa ela seria investigada e se seus crimes fossem descobertos, seriam punidos. 

Maximilian a desprezava. Em pouco tempo procurou se aproximar dela. Com seu eterno corpo de 19 anos (idade em que se tornou um vampiro, um ser da noite), ele seduziu uma das damas de companhia da condessa. Em pouco tempo foi apresentado a ela. Na verdade o vampiro só queria matar aquela mulher e tomar posse de seus bens e sua fortuna.

Uma riqueza como aquela poderia sustentar uma vida de luxos por alguns séculos. A necessidade de dinheiro para manter um alto padrão de vida foi uma das minhas preocupações constantes. A troca de identidades de tempos em tempos para não despertar suspeitas também era um desafio. Penso inclusive que já deveria ter ido embora de Paris há muitos anos. Ficar morando na mesma cidade, mesmo que seja uma grande cidade, pode ser fatal para uma criatura da noite. As pessoas mais velhas, idosas, começam a dizer que havia conhecido um jovem que era a minha cara.... Tadinhas das vovós, mal sabiam elas que era eu mesmo que havia conhecido elas na sua perdida juventude... 

Mas voltemos à história...

Eu sempre me apresentava para essas pessoas imensamente ricas como um especialista em antiguidades. Como havia vivido muito, sabia e conhecia reconhecer peças antigas, artigos de Versalhes, seus móveis, etc. 

Muita coisa foi roubada do Palácio de Versalhes durante a revolução. Aqueles ladrões jogaram todas aquelas peças preciosas no mercado negro... Jóias e móveis maravilhosos que inclusive tinham pertencido à rainha Maria Antonieta passaram a ser vendidas na feiras mais vagabundas de Paris... Esses ditos revolucionários não passavam de ladrões, é o que sempre digo...

Numa noite, conversando com a condessa, descobri que ela realmente era uma pessoa asquerosa. A condessa desfilou todos os seus preconceitos. Odiava negros e pessoas de cor. Era racista. Preconceito racial. Achava os homossexuais aberrações, isso apesar de ser uma lésbica violenta e possessiva. Como se pode perceber tinha preconceito sexual, ao mesmo tempo sendo a pessoa mias hipócrita da Europa. 

Dizia ser religiosa, mas sua vida pessoal era de pura devassidão. Mais uma prova de sua hipocrisia. E para fechar o quadro geral, odiava pessoas pobres. Tinha preconceito social contra as pessoas mais humildes. Era a mulher mais asquerosa da Europa. Seu destino era a morte. Eu estava pronto para cumprir esse destino.

Maximilian, com os longos anos passados, acabou se tornando uma pessoa culta. Era ótimo na conversação envolvendo livros, artes e história. Afinal ele tinha sido uma testemunha ocular de todos os acontecimentos desde os tempos de Maria Antonieta. 

Durante uma dessas noites a condessa o convidou para ir ao teatro com ela. Iriam de carruagem. Aliás a carruagem da condessa, vinda da Rússia, chamava atenção por onde passava. Era puro luxo e ostentação. E seria dentro dessa gaiola de ouro que o Lord vampiro iria atuar.

Já era tarde da noite quando saíram do teatro. Ao entrarem numa rua escura de Paris, Maximilian não perdeu tempo. Ele imediatamente deu uma pausa, olhou para a condessa e disse: "Seu destino chegou!". A condessa riu e perguntou: "O que você está querendo dizer com isso?"... mal houve tempo dela terminar a frase. 

Com suas garras de vampiro, Maximilian rasgou seu rosto. Ela ainda deu um grito, o que levou o condutor da carruagem parar para ver o que estava acontecendo. Ao descer e olhar pela janela ele viu Maximilian já sugando a jugular da condessa dentro da carruagem.

"Meus Deus! O que é isso?" - gritou o empregado. Maximilian percebendo que ele poderia criar problemas pulou fora da carruagem em um piscar de olhos. Com uma barra, tirada da lateral da carruagem, atingiu em cheio a cabeça do homem. Esse caiu imediatamente, seu sangue jorrava pela calçada escura e molhada da ruela. 

A condessa ainda respirava. Maximilian teria que matá-la, caso contrário ela iria virar uma vampira. Imagine uma pessoa ruim como aquela com os poderes de um ser da noite! 

Com a mesma barra que estava em mãos ele nem pensou duas vezes e a cravou no peito da nobre russa, destruindo seu coração com o impacto. O cenário foi desolador. A condessa destroçada, com o corpo arruinado e seu condutor afogado no próprio sangue. 

Maximilian então viu que ambos estavam mortos. Ele calmamente pegou seu elegante chapéu, sua capa e sua bengala sueca e saiu, tranquilamente pela rua, encoberto pela noite, que agora, após tantos anos como vampiro, aprendera a amar mais do que tudo nessa existência noturna.

E depois de uma semana lá estava o belo Maximilian alegando que era o sobrinho da condessa morta. Como ele não tinha filhos e nem parentes na França, foi relativamente fácil se tornar o único herdeiro de toda aquela riqueza que parecia não ter fim...

Ah, Maximilian, seu danadinho... tenho muito o que lhe agradecer...

O sobrenome russo que adotei era simplesmente horroroso e por uma questão de segurança jamais irei revelar aqui nessas páginas. 

O mais importante de saber é que fiquei imensamente rico. Vendi algumas propriedades da condessa e coloquei o dinheiro em seguros bancos suíços. Estava decidido a viajar pelo mundo... Deixando Paris para trás...

E com a minha cidade querida ficando no passado, ficaram também todos os que havia conhecido enquanto ser humano e enquanto ser da noite...

Pablo Aluísio. 

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